11 março 2007

Até quando? Por Alan Rodrigues



A expressão very important person (VIP), em inglês, define alguém com muito prestígio, poder e importância. Em português, nem tanto. Para muitos brasileiros que viajam a trabalho ou de férias para a Europa e os Estados Unidos, VIP quer dizer “viajante inocente preso”. O novo termo foi cunhado por um grupo de turistas do Estado do Pará – dentre eles homens e mulheres da alta sociedade de Belém –, que amargou mais de 20 horas de maus-tratos, discriminação e prisão em Nassau, capital das Bahamas, no final de fevereiro. Sem ao menos suspeitar de que algo parecido pudesse acontecer em sua viagem dos sonhos ao Caribe, eles foram retidos no próprio aeroporto e engrossaram as crescentes estatísticas dos cidadãos brasileiros barrados no Exterior e deportados sem motivo aparente.
Os 12 viajantes paraenses desembarcaram na paradisíaca ilha tropical com reservas em hotéis de luxo, passagens de ida e volta, passeios pagos e dinheiro, muito dinheiro. Tudo estava pronto para desfrutar o que há de melhor no arquipélago: o mergulho com tubarões, um esporte caro e inesquecível. Mas os sonhos desses empresários, dentistas, designers e advogados foram abortados pelos oficiais da imigração. Sem nenhumaexplicação, eles foram encaminhados para uma “sala VIP” e algemados. Daí em diante, foram horas de medo e terror. Apesar de todas as evidências de que eram turistas ricos e estabelecidos, foram tratados como típicos fora-da-lei. Literalmente, a pão e água. “Fomos levados para uma penitenciária como imigrantes ilegais ou bandidos”, disse o dentista Elias Serruya, 44 anos, um dos detidos. Vinte quatro horas depois, todos foram deportados para o Brasil.
A cada dia, mais e mais brasileiros passam por esse constrangimento no Exterior. Na sexta-feira 2, a União Européia barrou a entrada de 202 deles em cidades como Madri, Paris, Lisboa, Milão e Barcelona. São as vítimas da Operação Amazon 2, realizada pela Agência de Controle de Fronteiras Externas da União Européia (Frontex), que já mandou de volta mais de 500 turistas brasileiros desde o ano passado. Apesar da magnitude, a Operação Amazon 2 não inspirou nenhuma reação mais enérgica do Itamaraty.
O publicitário carioca Daniel Brito, 27 anos, é um dos deportados. Em agosto de 2006, depois de fazer uma turnê por França, Portugal e Espanha, Brito desembarcou em Londres, na Inglaterra. Nem bem pôs os pés no aeroporto Heathrow, Daniel foi detido pela polícia de imigração. “Disseram que eu era um suspeito em potencial”, indigna-se. Brito levava consigo toda a documentação exigida aos viajantes pela União Européia: seguro saúde, dinheiro para se manter, cartão de crédito internacional, endereço de permanência e período de visita comprovados pelas passagens de ida e volta para o Brasil. Mesmo assim, foi interrogado por três vezes. Dez horas depois, foi mandado de volta para Barcelona, último local que tinha visitado. O motivo? “Disseram que meu salário não correspondia com a realidade de um brasileiro de minha idade”, conta.
A Inglaterra e os países da União Européia não exigem emissão prévia de visto de entrada para os turistas brasileiros, como fazem os Estados Unidos. O carimbo é dado na entrada. Ou seja: o risco de viajar 12 horas de avião e ouvir um não é alto. Desde 2001, depois dos atentados terroristas em Nova York, Washington, Madri e Londres, essa tarefa ficou cada vez mais difícil e desagradável. Qualquer sinal de nervosismo é interpretado como uma confissão implícita de culpa. Do quê? Não importa. Qualquer um pode ser barrado. “Eles escolhem ao acaso. Não há um critério”, opina a secretária executiva Carina Lima, 28 anos, de São Paulo.
Em dezembro passado, Carina foi para a Espanha passar 16 dias. Iria se hospedar com amigos em Madri e visitar parentes em Valencia. Já tinha passagem de volta comprada. Ao desembarcar no aeroporto Barajas, começou o pesadelo. “Foi a pior coisa que ocorreu na minha vida”, conta. Seu crime: é mulher jovem, solteira, viajava sozinha e com pouco dinheiro em espécie: 160 euros. De nada adiantou mostrar seu cartão de crédito internacional, com limite de mil euros, suficiente para a estadia. Sem nenhuma justificativa, foi enviada a uma sala desconfortável e obrigada a entregar todos os seus pertences, inclusive remédios. “Fiquei desesperada. O local parecia uma cadeia e ninguém me explicava o que estava acontecendo.” Várias pessoas amontoadas dividiam beliches imundos e apenas um único espaço para o banho. “Não tinha nem como filmar aquele lugar horrível, pois eles tiraram o meu celular”, conta. Ela passou a noite em claro, chorando. Depois de dois dias, foi deportada sem explicações. Escoltada até o avião por policiais, a moça acredita que foi considerada pelas autoridades espanholas uma garota de programa. “Jamais esquecerei os sorrisos irônicos e as piadinhas das quais fui vítima.” Carina alega que procurou o Itamaraty, mas não teve nenhum apoio.
O Itamaraty diz que presta assistência jurídica aos repatriados que procuram ajuda. Segundo o Ministério, são raras as repatriações que envolvem desrespeito às leis internacionais e aos direitos humanos. Quando isso ocorre, o caso é investigado. A grande maioria dos brasileiros repatriados, segundo uma autoridade do Itamaraty que pediu para não ter o nome publicado, viaja com a intenção de trabalhar ilegalmente. Na prática, o governo parece estar lavando as mãos para o problema. “Não podemos reverter uma ação soberana de um Estado”, diz a fonte. O máximo que o Itamaraty fez foi pedir informações sobre ao alcance e a duração da Operação Amazon 2. Vai continuar esperando? Os turistas brasileiros gastam por ano mais de US$ 5 bilhões no Exterior e merecem mais respeito. Como não existe uma corte internacional que julgue casos de viajantes comuns presos injustamente e deportados, não há, na prática, a quem recorrer.
O Ministério da Justiça calcula que 15 mil turistas são repatriados a cada ano. Dez anos atrás, eram cinco mil. O País que mais deporta brasileiros é o México. Por ano, cerca de dez mil são capturados antes de tentar pular o muro que divide o país com os Estados Unidos. Mais de mil brasileiros são deportados deste país anualmente. Mas uma coisa é barrar imigrantes ilegais na fronteira. Outra, viajantes de turismo ou negócios no aeroporto. A médica mineira Márcia Barbosa, ex-presidente da Sociedade Mineira de Cardiologia e membro da American College of Cardiology, foi uma dessas vítimas.
Em 2004, depois de mais de 30 viagens ao Exterior para participar de congressos na área de saúde, Márcia foi barrada ao desembarcar em Dallas. Ela iria participar de um curso de ressonância magnética do coração. Não era sua primeira vez na terra de George W. Bush. Mesmo assim, teve o visto negado junto com outro médico e dois empresários. “Fomos interrogados como verdadeiros criminosos”, diz. Doze horas depois de ser fotografada como bandida, foi escoltada até a porta do avião e mandada de volta. “Nunca me senti tão indignada, humilhada e impotente em minha vida”, conta Márcia.

3 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Olá Amigo
Bom Domingo
Sempre ouvi dizer ..."Paga o justo pelo pecador"...Claro que não serve de desculpa ,mas estas são as consequências de vivermos num Mundo de "loucos"...Não achas?
Estas a ver porque gosto tanto do nosso Alentejo e da minha Aldeia....por enquanto naõ temos esses fulanos da "Imigração e fronteiras"....por enquanto!!!!ahahahaha silvana ramos sapage

11/3/07 12:00  
Blogger lami said...

Os brasileiros também não passam muito bem para entrar em Portugal e penam muito para conseguir autorizações de residência mesmo tendo trabalho. Sei disso por pessoas conhecidas.
Este mundo não está fácil e a América está um pouco mais paranóica, se calhar até compreendemos por quê!Isso não desculpa tudo mas quem se sentir seguro hoje, que atire a primeira pedra!

11/3/07 18:41  
Anonymous Anónimo said...

E todavia a VERDADEIRA BANDIDAGEM circula e raramente é detectada.
Vá lá a gente entender isto!
:(

11/3/07 19:06  

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