31 dezembro 2006

As crianças, Senhor!...


Que o ano de 2007 diminua as injustiças sociais e dê um mundo melhor a TODAS AS CRIANÇAS.
A dureza da vida de crianças em abrigos, submetidas a uma rotina de negligência. Trechos do documentário foram apresentados no programa Debate, da GloboNews, "O QUE O DESTINO ME MANDAR".
(clique na imagem)

30 dezembro 2006

UM CICLISTA


O passado é como o mar: nunca sossega. As casas encolhem, como os velhos, ao passo que as árvores crescem sem parar. Quando regressamos, decorridos muitos anos, aos lugares da nossa infância encontramos árvores gigantescas e sufocando de terror à sombra delas as casas minúsculas que um dia foram nossas. Mal reconhecemos a cama de bonecas em que dormimos quando éramos crianças, ou o quintal, que sempre julgámos ser imenso, e que tem, afinal, apenas dois palmos de fundo.
O meu pai dizia-me:
- A vida é uma corrida, meu filho. Quem olha para trás enquanto corre arrisca-se a tropeçar.
Eu não olho para trás. Avanço por vezes de olhos fechados, e tropeço, como os outros, e eventualmente caio, mas não olho para trás. Nunca fui pessoa de cultivar saudades. Não colecciono álbuns de fotografias, e jamais guardei pétalas secas entre as páginas de velhos livros. Sigo sempre em frente. Quando me perguntam para onde vou encolho os ombros. Rio-me:
- Adiante.
O mundo é infinito para quem viaja a pé. Eu viajo a pé, à boleia de algum camião, ou de bicicleta. Andando de camião, ou de bicicleta, o mundo parece um pouquinho menor, mas ainda assim, digo-lhe, meu bom amigo, é uma imensidão. Não tenho muitos estudos. Aprendi a ler e a contar, pouco mais. Raramente leio o que quer que seja. Quando encontro algum jornal lanço uma vista de olhos à página da necrologia. Como não conheço ninguém, como ninguém espera por mim em parte alguma, choro pelos desconhecidos, aqueles que me parecem mais simpáticos, vou pelo semblante, entende?, isto se a fotografia do defunto estiver bem impressa, ou então pelo nome. Há sempre algum José por quem chorar. Não choro de pena. Choro apenas para praticar. Enquanto viajo conto os quilómetros para iludir o tédio. Desconheço o que me espera quando cruzo uma fronteira. Impus a mim mesmo uma condição: não passar duas vezes pela mesma estrada. Cheguei à uma semana do Huambo. O senhor conhece?... Nasceu lá? Extraordinária coincidência, é que eu também nasci numa cidade chamada Huambo, mas muito longe deste país, nas montanhas do Peru. Tinha uma leprosaria que o Che Guevara visitou. Não há lugares repetidos. Só os nomes se repetem. Quer saber como faço para sobreviver? Estou atento. Há poucos dias um camponês disse-me apontando em redor:
- Tudo o que não é mato engorda.
Concordo. Veja bem as mangas. Durante um mês, enquanto atravessei o Congo, comi apenas mangas. Só o perfume das mangas, se forem doces, já alimenta. Isso, ou um canavial a arder. Goiabas maduras. Também se pode sobreviver muito tempo comendo unicamente milho ou feijão. Um homem em andamento não morre de fome. Entrei em Agola pedalando esta bicicleta. Não sabia que o país estava em guerra. É como lhe disse, acredite em mim, não leio os jornais, e quando leio passo por alto a política. A política não me interessa. Vim descendo uma estrada imensa. Estranhei não haver um carro. Ninguém naquela estrada. Quando cheguei a Luanda disseram-me que a estrada estava minada, que há anos ninguém passava por ali, e quiseram saber como é que eu conseguira evitar as minas. Encheram-me de perguntas. Respondi-lhes: sobrevivi porque não sabia que havia minas. Se soubesse não teria conseguido. A sorte protege os arganazes. É um provérbio lá da minha terra. Ou podia ser. Em determinada altura, numa longa descida, vi que havia soldados agachados em ambas as margens da estrada. Quando dei por eles já era demasiado tarde para parar. Não parei. Cumprimentei-os, «bons dias, bons dias», e continuei. Ficaram ali, de olhos muito abertos, a verem-me passar. Fui depois de Luanda até Benguela e de Benguela ao Lubango. A seguir desci a serra e entrei no deserto. Na primeira noite dei com um acampamento de pastores. Ofereceram-me leite azedo. Na tarde seguinte parou um jipe à minha frente. Um branco e um preto. Ficaram muito admirados por verem um tipo assim como eu, meio índio, tão longe de tudo. Também eles me deram água. Trouxeram-me no jipe até aqui, a esta cidade do Namibe. Acontece chegar a uma cidade e achar que é agradável e então deixo-me estar um mês ou dois, procuro trabalho, engordo, e sempre ganho algum dinheiro para gastar no caminho. Lavo pratos, esfrego o chão, e além disso sou um bom cozinheiro. Quando sinto que me começo a afeiçoar a um lugar, despeço-me e vou-me embora. Quem não ama não sofre. Quem nada tem, não tem nada a perder. É o que penso. Um dia adormeci no topo de um enorme despenhadeiro. Acordei com a primeira luz. A manhã pousou-me no ombro, como um pássaro, e ali ficou. Diante de mim havia o mar. Atrás de mim o céu profundo, altas montanhas. Era um lugar sem exemplo, arredado do mundo, como um elefante velho que se perdeu da manada. Até àquele instante eu viajava sem saber porquê. E então, sentado sobre o abismo, ocorreu-me pela primeira vez essa questão. «O que faço aqui?» Pensei em voltar para trás. Porém, tinha caminhado de mais, e já tanto fazia recuar como avançar. Continuei em frente. Hoje viajo para saber porquê. Desaponta-o, talvez, este final – esperava outro? Se tivesse ficado lá atrás, nas montanhas do Peru, onde nasci, venderia botões, como o meu pai. Teria algo a perder, família e dinheiro, por certo sofreria mais. Quanto ao resto não sei se seria, em substância, muito diverso do que sou. Ignoraria certas coisas, sim, o senhor tem razão, mas não me prejudicaria tal ignorância, pois nem sequer daria por ela. Talvez um dia eu pare. Talvez não.

José Eduardo Agualusa in «Passageiros em Trânsito»

26 dezembro 2006

Paulo Gonzo


Clique na imagem e veja e oiça "Sei te de cor".

20 dezembro 2006

Vocabulário médico na voz do povo


Nota prévia: A maioria das situações são fictícias mas os termos empregues foram recolhidos no Centro de Saúde de Olhão, sendo o espelho da confusão semântica e de vocabulário que tantas vezes existe nas cabeças dos nossos utentes... Por partilharem comigo as suas histórias, os meus agradecimentos às funcionárias administrativas Inês Simões e Fernanda Veloso, assim como à técnica de cardiopneumologia Sandrina Marto.
6h da manhã. O Sol já aparecia distinto sobre o azul celeste. Em torno da porta do Centro de Saúde, um pequeno grupo de utentes organizava-se para a marcação da consulta "à vaga". A maioria já se conhece. Afinal todos são já bem experimentados nesta forma bem própria de utilização da consulta. Aliás, o Director do Centro de Saúde até mandou instalar uns banquinhos de jardim no local, para tornar a espera mais atractiva. É uma excelente oportunidade para trocar experiências e conhecimentos, que todos vão acumulando ao longo do seu percurso de contactos com os médicos e hospitais.
A Maria do Céu vai à consulta do "Parlamento", a Dona Gertrudes vai à consulta da "Monopausa" e a Rita é que as corrige, informando-as que aquela consulta chama-se de Planeamento Familiar. Uma tem um "biombo" no "úbero" e leva os resultados duma "fotografia", outra está preocupada com comichões na "serventia" do marido, até porque ele, havia poucos dias, tinha já sido consultado pelo médico por estar com os "alforges" todos inflamados. Alguém logo ali diagnosticou um problema na "aprosta" do marido. Mais à distância desta conversa, um grupo de senhoras falavam dos métodos contraceptivos e, uma delas, peremptória, afirmava que nunca aceitaria porem-lhe uma "fateixa" dentro da barriga! Uma outra discordava, e lá lhe foi dizendo que por causa disso é que teve tantos filhos, felizmente todos de parto normal, só o último foi de "açoreana", mas aquele que lhe dava mais problemas era o mais velho, que já era "toxico-correspondente"! Noutro local, um grupo de homens mais idosos ia falando da relação entre o "castrol" e a "atenção". Às tantas um deles começa a explicação cuidada dum acidente que tivera. Por isso é que tinha a vacina contra o "tecto" em dia, mas o acidente estragou-lhe a "tibiotísica" e causou-lhe uma hérnia "fiscal", pelo que tinha ido fazer uma "fotocópia" e um "traque". Outro referiu que nunca teve problemas de ossos, o seu problema era uma grande "espirrogueira na peitogueira". Uma senhora, atraída pela conversa, queixava-se de entupimento no "curso" com dores "alucinantes" quando se "abaixava". Além disso cobria-se de suores e "gómitos", ficava "almariada" e tudo acabava com uma forte "encacheca", ficando cerca de 3 dias com cara de "caveira misteriosa". Alguém lhe falou nuns supositórios que a poderiam ajudar mas ela já os conhecia, aparentemente tinham sido muito difíceis de engolir, pelo que o melhor ainda era o "clistério". Finalmente, uma outra senhora queixava-se da "úrsula" no "estambo", pelo que vinha mostrar o resultado duma "endocuspia" e ainda algumas análises especiais, como a Proteína C Reaccionária.

8h:30 h da manhã. Ainda havia muito para conversar mas a Inês, jovem funcionária administrativa do Centro de Saúde, obviamente tarefeira, acaba de chegar. Os funcionários administrativos não podem chegar atrasados, caso contrário, confundir-se-iam com os doutores. - Quem é o primeiro, se faz favor? Ora diga lá o seu nome?
- Josefina Trindade.
- Idade?
- 67 anos.
- Estado...?
- Constipada, muito constipada!

9h da manhã. Aparece a enfermeira Freitas que grita para a pequena multidão barulhenta que cerca a Inês:
- Quem está para medir as tensões? É você? Então entre e diga-me, qual é o seu problema?
- Sabe, senhora enfermeira, o meu problema é ter uma doença"arrendatária" que "arrendei" do meu pai e já me levou uma vez aos cuidados utensílios"do hospital. Afecta-me as "cruzes renais" e por isso dá-me muita "humidade" à volta do coração". Aliás, o doutor pediu-me uma "pilografia" e um"aerograma" que aqui trago e recomendou-me beber pouca água.

Finalmente, chega o médico, que logo dá início às consultas:
- Então de que se queixa?
- De uma angina de peito, senhor doutor. Tudo começou há uma semana quando fui às urgências. O médico disse-me que era uma angina na garganta, mas a angina começou a descer e agora apanha-me o peito todo!
Alguns perguntavam à Inês onde era o "pechiché da retrosaria" para pagarem a taxa moderadora. O senhor Batista foi dos utentes que saiu mais zangado da consulta. Permaneceu estoicamente na fila desde as 5:30 h da manhã e, agora, o médico tinha-lhe dito que o seu atestado para carta de condução era com outro: o Delegado de Saúde. Finalmente é chamado pelo Delegado de Saúde para o exame do atestado:
- Sr. Batista, faça-me o favor de pôr o dedo no nariz. Não, senhor Batista, não é no meu, é no seu nariz!
O utente estava muito nervoso e depois do primeiro falhanço achou por bem enterrar o dedo profundamente nas fossas nasais! O Delegado de Saúde desiste:
- Muito bem, senhor Batista! Fica com a carta com as mesmas restrições anteriores. O Sr. Batista saiu radiante - tinha, pelo menos, mais 2 anos de carta para conduzir - e ao passar pelos outros utentes que ainda esperavam, avisou:
- Espero que estejam constipados, porque só passa quem tiver uns bons macacos para tirar do nariz!
(recebido por email)

15 dezembro 2006

Árvore na Praça do Comércio em Lisboa

A maior árvore de Natal da Europa, com 72 metros de altura, foi inaugurada no dia 19 de Novembro na Praça do Comércio, onde ficará até 8 de Janeiro.
A árvore de Natal Millennium BCP/SIC, com 72 metros de altura - mais 10 metros do que a árvore que esteve no ano passado em Belém - equivale a um prédio de 23 andares, tendo o dobro da altura da Torre de Belém e mais dois metros do que a distância que separa as águas do Tejo do tabuleiro da Ponte 25 de Abril. A estrutura metálica tem180 toneladas de peso. São utilizados 2,2 milhões de micro lâmpadas, 15 mil mini-lâmpadas redondas, 18 quilómetros de mangueira luminosa, 380 strobes (focos de luz intermitentes), 320 metros de néon, 8 moving lights (focos móveis de longo alcance) com potências entre os 2 mil e os 7 mil watts e 144 painéis decorativos. A produção global envolveu 350 pessoas que levaram 44 dias a montar toda a estrutura de 25 quilómetros de tubos de metal. Este ano a árvore de Natal lisboeta tem uma réplica em Varsóvia, tendo sido ambas inauguradas no mesmo dia e à mesma hora.
Imagine agora que tem poderes especiais e que se pode colocar, por artes mágicas, no cima desta árvora. Já pensou no que poderia ver? Sofre de vertigens e tem medo de cair? Mas não faz absolutamente mal nenhum. Tudo o que tem a fazer é clicar na imagem acima e será imediatamente transportado para cima da árvore que está na Praça do Comércio. Não acredita? Então experimente!
A.Gil

12 dezembro 2006

Curiosidades dos anos 1600 a 1700


Quando se visita o Palácio de Versailles, em Paris, observa-se que o sumptuoso palácio não tem casas de banho. Na Idade Média, não existiam dentífricos ou escovas de dentes, perfumes, desodorizantes, muito menos papel higiénico. As excrescências humanas eram despejadas pelas janelas do palácio.
Em dia de festa, a cozinha do palácio conseguia preparar um banquete para 1.500 pessoas, sem a mínima higiene.
Vemos, nos filmes de hoje, as pessoas sendo abanadas. A explicação não está no calor, mas no mau cheiro que exalavam por debaixo das saias (que propositadamente eram feitas para conter o odor das partes íntimas, já que não havia higiene).
Também não havia o costume de se tomar banho devido ao frio e a quase inexistência de água canalizada. O mau cheiro era dissipado pelo abanador. Só os nobres tinham empregados para os abanar, para dissipar o mau cheiro que o corpo e boca exalavam, além de também espantar os insectos.
Quem já esteve em Versailles admirou muito os jardins enormes e belos que, na época, não eram só contemplados, mas "usados" como vaso sanitário nas famosas baladas promovidas pela monarquia, porque não existia banheiro.
Na Idade Média, a maioria dos casamentos ocorria no mês de Junho (para eles, o início do verão). A razão é simples: o primeiro banho do ano era tomado em Maio; assim, em Junho, o cheiro das pessoas ainda era tolerável.
Entretanto, como alguns odores já começavam a incomodar, as noivas carregavam buquets de flores, junto ao corpo, para disfarçar o mau cheiro. Daí termos Maio como o "mês das noivas" e a origem do "buquet de noiva" explicada.
Os banhos eram tomados numa única banheira enorme, cheia de água quente. O chefe da família tinha o privilégio do primeiro banho na água limpa. Depois, sem trocar a água, vinham os outros homens da casa, por ordem de idade, as mulheres, também por idade e, por fim, as crianças. Os bebés eram os últimos a tomar banho. Quando chegava a vez deles, a água da banheira já estava tão suja que era possível "perder" um bebé lá dentro. É por isso que existe a expressão em inglês "don't throw the baby out with the bath water", ou seja, literalmente, "não despeje o bebé juntamente com a água do banho", que hoje usamos para os mais apressadinhos.O telhado das casas não tinha forro e as vigas de madeira que os sustentavam era o melhor lugar para os animais - cães, gatos, ratos e besouros se aquecerem. Quando chovia, as goteiras forçavam os animais a saltarem para o chão. Assim, a expressão "está chovendo a potes" tem seu equivalente em inglês em "it's raining cats and dogs" (chovem gatos e cães).
Aqueles que tinham dinheiro possuíam pratos de estanho. Certos tipos de alimento oxidavam o material, fazendo com que muita gente morresse envenenada (lembremo-nos de que os hábitos higiénicos da época eram péssimos). Os tomates, sendo ácidos, foram considerados, durante muito tempo, venenosos.Os copos de estanho eram usados para beber cerveja ou whisky. Essa combinação, às vezes, deixava o indivíduo "no chão" (numa espécie de narcolepsia, induzida pela mistura da bebida alcoólica com o óxido de estanho). Alguém que passasse pela rua poderia pensar que ele estivesse morto e, assim, recolhia o corpo e preparava o enterro. O corpo era, então, colocado sobre a mesa da cozinha por alguns dias e a família ficava em volta, em vigília, comendo, bebendo e esperando, para ver se o morto acordava ou não. Daí surgiu o velório, que é a vigília junto ao caixão.
Em Inglaterra, alguns anos após um cadáver ser enterrado, os caixões eram abertos, os ossos retirados e postos em ossários e o túmulo utilizado para outro cadáver. Às vezes, ao abrirem os caixões, percebia-se que havia arranhões nas tampas, do lado de dentro, o que indicava que aquele morto, na verdade, tinha sido enterrado vivo. Surgiu, assim, a ideia de, ao se fechar o caixão, amarrar uma tira no pulso do defunto, passá-la por um buraco feito no caixão e amarrá-la a um sino. Após o enterro, alguém ficava de plantão ao lado do túmulo, durante uns dias. Se o indivíduo acordasse, o movimento de seu braço faria o sino tocar. E ele seria "saved by the bell", ou "salvo pelo sino", expressão usada por nós até aos dias de hoje.
(recebido por e-mail)

11 dezembro 2006

Ganhar um milhão de dólares?

(Obrigado, Arlete)

09 dezembro 2006

CORAÇÃO DE MENINO MIMADO




Este texto não tem poesia alguma, não tem devaneios e talvez contenha poucas reflexões. Porque vou contar algo que me aconteceu ontem. É assim que me curo, falando das minhas feridas, deixando-as sangrar pelos meus próprios dedos.
Ontem era o dia do meu rodízio (em São Paulo a polícia de trânsito restringe a circulação de automóveis numa determinada área da cidade de acordo com a matrícula; em determinados dias da semana, por exemplo, carros com matrículas que terminem em 1 e 2 estão proibidos de circular às segundas-feiras no período das 8 ás 10 e das 17 às 20) e fiquei a passar tempo por perto do meu local de trabalho. Aproveitei para ir à locadora escolher alguns filmes e depois fui ao banco fazer pagamentos. Escolhi um banco que ficava em caminho para ir embora.
Que eu saiba, conscientemente não queria encontrar ninguém. Porém imagino que o meu inconsciente queria. E a caminho do banco encontrei alguém; primeiro o carro era familiar, mas eu não queria acreditar que era quem eu estava a pensar. Mas era.
Fiquei até com vergonha de me aproximar, acho que com medo também, porque a minha reacção é sempre desmedida e desatinada. Ela era Alguém que eu magoei profundamente.
Alguém que traí e a quem não tratei dignamente. Alguém que me amava muito. E essa é hoje a marca mais profunda na minha alma. O capítulo mais triste da minha vida até agora.
Por isso estou a chamar ao meu coração de “coração de menino mimado”. Porque eu não posso querer certas coisas na vida, não tenho esse direito, nem devo imaginar que tudo vai acontecer de acordo com a minha vontade. Nós magoamos as pessoas e recebemos, em contrapartida, muita dor; comigo pelo menos é assim. Mas é importante saber viver dentro deste cenário. Saber aceitar as consequências dos nossos actos. Pago o preço e conto ao mundo, quem sabe as pessoas sabendo não vão cometer o mesmo erro que cometi.
Ela seguiu o caminho dela com o seu carro e eu, dominando o meu coração mimado, chorei. Fui ao banco e fiz o que tinha a fazer, as pernas ainda trémulas. E a caminho do carro eu ainda a vi mais uma vez, ela tinha que passar pela mesma rua de novo. Imagino que me tenha visto, ou talvez não...
Ela está bem, já disse outro dia por e-mail que está feliz, e pediu para não deixar mais poemas na sua caixa de correio. Em tempos de modernidade e mensagens virtuais eu queria sempre deixar na caixa de correio do portão da casa dela os meus pensamentos. E agora penso naquela música da Adriana Calcanhoto: “Quero que sejas bem feliz junto do teu outro rapaz”. Não se pode voltar atrás, mas o destino insiste em pregar partidas ao meu coração de menino mimado (pena eu estar tão racional e acreditar que tudo isto é uma coincidência).
S onho com o futuro, mas sei que o futuro é uma ilusão, que será sempre diferente do que imagino. Presentemente, aplico as grandes lições que aprendi com essa a quem chamo “Pastora de Nuvens”. Por isso o meu coração de menino mimado a cada dia que passa está a ser substituído por um coração de verdade. É um transplante de um coração mimado por um coração dourado (prometi que não haveria poesia neste texto, mas não resisti).
Sei que ela já não lê o que escrevo, mas se lesse eu diria:
“Obrigado por teres feito de mim um homem de verdade e perdoa-me por te ter magoado. Graças a Deus o amor colocou na tua vida alguém que te vai curar as feridas que te causei. E se por acaso o destino não me pregar mais partidas, como a de te encontrar novamente “sem querer”( esta já foi a segunda vez) , sabe que sempre, mas sempre, me vou lembrar de ti e de todo amor que tu me deste...

(Passado para português europeu por A.Gil)

07 dezembro 2006

Coisas Bonitas




Há coisas bonitas na vida.
Bonitas são as coisas
vindas do interior,
as palavras simples,
sinceras
e significativas.


Bonito é o sorriso
que vem de dentro,
o brilho dos olhos...


Bonito é o dia de sol
depois de uma noite chuvosa
ou as noites enluaradas de verão
em que todos saem de casa.


Bonito é procurar
estrelas no céu
e dar de presente
ao amigo, amiga, namorado...


Bonito é achar
a poesia do vento
das flores
e das crianças.


Bonito é chorar
quando se sentir vontade
e deixar que as lágrimas
rolem sem vergonha
ou medo de crítica.


Bonito é gostar da vida
e viver do sonho.


Bonito é ser realista
sem ser cruel,
é acreditar na beleza
de todas as coisas.


Bonito é a gente
continuar a ser gente
em quaisquer situações.


Bonito é você
ser você.


Letíca Thompson in Gotas de Crystal

06 dezembro 2006

MULHERES FENOMENAIS


Tem sempre presente que a pele se enruga, o cabelo embranquece, os dias convertem-se em anos... Mas o que é importante não muda; a tua força e convicção não têm idade.
O teu espírito é como uma qualquer teia de aranha. Atrás de cada linha de chegada, há uma de partida. Atrás de cada conquista, vem um novo desafio.
Enquanto estiveres viva, sente-te viva. Se sentires saudades do que fazias, volta a fazê-lo. Não vivas de fotografias amarelecidas...
Continua, quando todos esperam que desistas. Não deixes que enferruje o ferro que existe em ti. Faz com que em vez de pena te tenham respeito.
Quando não conseguires correr através dos anos, trota. Quando não conseguires trotar, caminha. Quando não conseguires caminhar, usa uma bengala.
Mas nunca pares!!!

(Madre Teresa de Calcutá)

02 dezembro 2006

E por falar em você...


Ruas, travessas, becos, esquinas,
Sacadas, varandas, janelas entreabertas,
O tempo nublado, calçadas molhadas,
A chuva miúda, o cheiro de terra,
Momentos de espera, estou tão sozinho,
A barulho dos carros apressados que passam,
O mês é Maio, já primavera,
Andar sem sossego por toda a cidade,
Tomar um conhaque, fumar um cigarro,
Melhor ir para a casa compor um poema,
Dedilhar no piano um velho bolero,
Sussurrar o teu nome, você está tão longe,
O telefone que toca, desculpe, é engano!
Continuo te amando apesar dos enganos,
Comprei o teu perfume e espalhei pelo quarto,
Ainda sou um romântico,
Um incorrigível romântico!
O teu retrato ainda mora na cabeceira da cama,
Já são mais de dez horas nesta cidade nublada,
Já faz tanto tempo que a saudade é um tormento,
Queria poder viajar para bem longe,
Queria poder me encontrar com você,
Tentar refazer, acertar desta vez!
Os meus muitos defeitos?
Alguns consertei!
O livro de contos?
Ainda não terminei!
Para ser bem sincero,
Faz tempo eu não pego,
Já faz algum tempo,
Só escrevo poemas,
O mesmo tema de sempre.
E por falar em você...

Naldo Velho

01 dezembro 2006

Enquanto os ébrios viverem...


(Para minha Mãe, Angolana, falecida em Dezembro de 1992)

Mãe...
Do mais medonho dos sonhos,
Acabei de despertar,
Vi nossa Terra morrendo,
Milhares de Mães a chorar.
Seus Filhos, foram para a guerra!
-
Se voltam? quem vai saber...
Enquanto outros, felizes,
Passam noites a beber.
Bebendo a sorte e a vida,
Dos que não fazem fortuna...
Bebendo para esquecer,
As crianças, que de fome,
Morrem, em qualquer esquina.
-
Suas camas são as praias.
As estrelas são seus tectos,
As mesas são Contentores,
Que os alimentam de restos.
Restos daqueles que bebem,
Indiferentes à dor.
E em seus Ninhos de Luxo...
Fingem não ouvir gemidos,
Das gentes da mesma côr.
-
Mãe...
Do mais medonho dos sonhos,
Acabei de despertar,
Vi nossa Terra morrendo,
Milhares de Mães a chorar.
-
Filhos a pedirem pão.
Netos a pedirem pão.
Velhos a pedirem pão.
No rosto daquelas Mães,
Vi a tristeza estampada,
Quando filhos pedem pão,
Elas estendem as mãos,
E oferecem-lhes mãos cheias,
De carinho, sem mais nada.
E lá ficam a definhar...
Com os corpos a definhar.
Com as almas a definhar.
Com as Mães a definhar.
Quase nuas de pobreza,
Com os ventres a inchar,
Mas com a revolta hidratada
Com lágrimas de tristeza.
-
Mãe...
Do mais medonho dos sonhos,
Acabei de despertar.
Vi nossa terra morrendo,
Milhares de Mães a chorar.
-
A verem carros de Luxo,
Muito bem refrigerados,
Circulando nas cidades,
Sempre com vidros fechados,
Ébrios no seu interior,
Alheios à aflição,
Dos que perderam as pernas,
Dos que perderam os braços,
Dos que perderam os Pais.
Dos que perderam irmãos.
Mas um dia, irão talvez
Sentir o ódio das Mães,
Mães que perderam o tecto.
-
Mães que perderam o pão.
Mães que perderam os filhos.
Mães que perderam a vez...
-
Ébrios, com lindas mulheres,
Desfilando entre a miséria,
Longas tranças multi-côr,
Deslumbrantes "St.-Laurent",
Lindos Brilhos de "Dior",
Saltos - altos de "Kenzo",
Acabados a verniz,
Exibindo Belos Corpos,
Que os ébrios, Ricamente,
Enfeitaram, com a fome daquele povo,
No "prêt-à-porter" de Paris.
-
Mãe...
Se com Deus puderes falar,
Pede a "Ele" para os matar,
Enquanto os ébrios viverem...
As "malambas" não vão mudar,
Disso, eu tenho a certeza.
Se com Deus puderes falar,
Pede a "Ele" para os matar,
Que "ele" os mata concerteza.
-
(Olimpio C. Neves, Lisboa, Portugal)
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